11 de janeiro de 2011

Quando o prazer se transforma numa armadilha....



Porque às vezes o prazer pode colocar-nos em risco....deixo aqui o fantástico artigo da jornalista Paula Cosme Pinto para a ÚNICA!


Sexo: Prazer... de cortar a respiração


Há quem sinta prazer ao ser asfixiado... e quem acabe por morrer, como o
actor David Carradine e o apresentador inglês Kristian Digby. Afinal, porque
é que tanta gente arrisca a asfixia erótica?


Texto de Paula Cosme Pinto (www.expresso.pt)

"Tapar a boca com a mão ou com uma almofada, meter uma máscara de látex na
cabeça, prender uma corda ao pescoço... A busca do prazer através da asfixia
tem chegado às luzes da ribalta, mas pelos piores motivos: em vez de um
orgasmo como clímax, a brincadeira sexual arriscada termina muitas vezes em
morte."

Em Junho de 2009, o actor da série "Kung-Fu", David Carradine, de 72 anos,
foi encontrado morto num quarto de hotel em Banguecoque. Estava todo nu, com
uma corda ao pescoço e outra a amarrar os órgãos genitais. Já em março deste
ano, o apresentador da BBC Kristian Digby, de 32 anos, foi também encontrado
sem vida em casa, com um saco de plástico na cabeça, preso por um cinto ao
pescoço. Depois das respectivas autópsias, ambas as mortes foram arquivadas
como casos de "asfixia auto-erótica" que correram mal.

Embora em Portugal estes casos não cheguem às folhas dos jornais, o
psiquiatra Afonso de Albuquerque garante que "todos os anos cinco a oito
portugueses morrem de asfixiofilia autoinduzida". Prática que pertence ao
grupo das parafilias, ou seja, das preferências eróticas pouco comuns.

"Ao nível do cérebro, o lóbulo frontal vai sendo desligado pela falta de
oxigenação. Ficam assim desinibidas todas as estruturas que gerem o
autocontrolo, o que leva ao aumento da intensidade das fantasias, da erecção,
chegando mesmo a atingir-se o orgasmo", explica o especialista, que escreveu
o livro "Minorias Eróticas e Agressores Sexuais", onde a asfixiofilia é
descrita como uma prática "particularmente perigosa". "Além da possibilidade
de culminar com a morte dos envolvidos, um cérebro que não recebe sangue
repetidamente não fica certamente em boas condições mesmo que sobreviva."

O médico alerta ainda para os perigos dos desmaios em cenário de
auto-masturbação. "A pessoa geralmente prende o pescoço com uma corda ou um
cinto e põe-se numa posição em que o simples peso do corpo leve à asfixia
gradual, com pequenas perdas de consciência", conta Afonso de Albuquerque.
"Se calha a desmaiar, pode tornar-se demasiado tarde para desapertar o laço
e conseguir evitar a morte."

Embora seja mais comum correr mal quando são auto induzidas, as práticas de
asfixia são também muito comuns a dois, em jogos de sadomasoquismo. "Em vez
de actividade masturbatória, passa a haver um jogo a dois de domínio e
submissão." E o psiquiatra aproveita para relembrar: "Os estudos apontam que
para cada mulher submissa existem 20 homens que o são."


À tua mercê


Lady M., 29 anos, dominadora de renome no panorama nacional do Bondage
Domínio Sadismo e Masoquismo (BDSM), não tem dúvidas quanto ao breath play
(jogo de respiração): "Controlar o ar que o outro respira ou não é uma
sensação de poder única e superior." Entre os submissos, submissas e
escravos que passam pelo seu estúdio, o pedido de asfixia é "frequente",
seja com a mão, máscaras de gás ou látex.

É o caso de JMSlave, um submisso de 54 anos, que gosta de se "sentir nas
mãos" da sua "dona e senhora", sem saber "até onde ela irá" ou até onde ele
conseguirá "aguentar". A "ideia do perigo", essa, faz assumidamente parte do
prazer. Contudo, o submisso, que prefere não revelar a sua verdadeira
identidade, assegura: "Sei que está tudo sob controlo. É como conduzir a
alta velocidade. Primeiro temos de ter noção do domínio do carro e conhecer
a estrada por onde seguimos." Quanto às mortes que chegam à comunicação
social com cada vez mais regularidade, JMSlave conclui: "São situações
desregradas que nada têm a ver com a prática cuidada que este fetiche
exige."

Com "patamares de excitação difíceis de controlar", o conhecimento mútuo dos
limites dos envolvidos é primordial nesta prática. Lady M, dominadora para
quem "nenhum pedido é bizarro", garante que nunca teve uma experiência que
corresse mal. Contudo, existem regras: "O submisso não pode estar
imobilizado de forma alguma, porque nunca se sabe se me pode acontecer a mim
alguma coisa e perder o controlo da situação."


Parafilia do foro psiquiátrico


São precisamente os casos que ficam fora de controlo e terminam de forma
dramática que chegam à classe médica. "É raro pedirem-nos ajuda", conta o
psiquiatra Afonso de Albuquerque, que ressalva: "Esta parafilia pertence à
lista de doenças do foro psiquiátrico e tem tratamento se o seu praticante
quiser, o que se conta pelos dedos das mãos."

Quanto aos casos analisados, os que chegam ao consultório do psiquiatra vêm
na maioria das vezes através de processos médico-legais. "A própria polícia
fica confusa com o que se passou, podendo interpretar os cenários como
suicídio ou assassínio." Embora no mundo BDSM as "práticas sejam
consentâneas", em caso de morte de um dos envolvidos quem sobrevive pode
"ficar em maus lençóis" para provar a sua inocência, lembra o médico.
Contactada pelo Expresso, a Polícia Judiciária diz não ter quaisquer dados
específicos sobre mortes relacionadas com asfixiofilia.

Embora para muitos a asfixia erótica seja ainda um tabu bem guardado dentro
das quatro paredes do quarto, há nomes que ficaram imortalizados
precisamente por causa dessa prática. Uns porque, como Carradine, Digby ou
ainda o vocalista dos INXS, Michael Hutchence, deixam os seus fãs
boquiabertos com o bizarro desfecho das suas vidas. Outros porque - tal como
a japonesa Sada Abe, que matou o amante por asfixia e depois lhe cortou o
pénis e os testículos acabam por ser inspiração de realizadores de filmes
eróticos de culto, como o emblemático "Império dos Sentidos".

Embora possam ser usadas drogas que propiciem a dificuldade de oxigenação no
cérebro, o estrangulamento continua a ser o preferido dos aficionados desta
prática. "O elemento fundamental nos jogos sadomasoquistas nem sequer é o
orgasmo ou o prazer físico sexual", conclui o psiquiatra. "É acima de tudo o
prazer que se exerce ou deixa exercer sobre si próprio. É a eterna questão
do domínio."

(Texto publicado na edição de 30 de Dezembro da revista Única)

Foto aqui


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